28.3.07

Just a Girl

Apontamentos para um discurso feminista

Mudei de terapeuta e o que eu mais temia aconteceu: tive que começar tudo de novo. Hoje foi a 3ª. Sessão e quando eu dei por mim, lá estava eu discutindo a minha relação com o masculino, o lugar do masculino e do feminino “na minha vida” (o que significa uma combinação de “na minha cabeça” com “neste mundo”), e por consequência, a minha relação com os homens e mulheres da minha vida, o meu pai, minha mãe, meu irmão, o namorado... Saí de lá pensando que esse assunto me aborreceu a vida inteira.


Na adolescência eu era a filha “revolucionária” de um pai que tinha o rei na barriga, a irmã encrenqueira de um irmão que tinha um reizinho na barriga, mas que só era capaz de definir os meus ataques de feminismo com a frase “Camille Paglia baixou em mim” porque o soberano do lar pagou a minha educação até níveis estratosféricos para uma princesinha da sociedade brasileira. Dá pra ver que não é simples.

Na teoria Junguiana este embate entre o lugar do homem e da mulher na sociedade reflete uma disputa que acontece cotidianamente dentro de nossa psiquê durante o processo de individuação. Para Jung todos os seres humanos têm em si características que socialmente se convencionou serem pertinentes a este ou àquele sexo, mas que são do ponto de vista psicológico igualmente importantes. Sendo ambos os tipos necessários para a formação de uma personalidade completa, Jung demonstra como uma das maiores dificuldades do processo de amadurecimento é o trazer das profundezas inconscientes aquelas partes de nós que são tradicionalmente tidas como pertencentes ao outro sexo, e integrá-las à consciência. Não obstante a dificuldade envolvida neste processo, Jung mostra como ele acontece inevitavelmente, como que movido por uma parte do Self que deseja e impulsiona este auto-completar-se. Para Jung, o apaixonar-se é ver no outro as nossas próprias características inconscientes projetadas, e é por isso que se diz procurar no amor alguém que nos “complete”

Hoje em dia, com quase 30 anos e ainda solteira - por opção -, mas ainda acreditando que vai chegar o momento em que eu vou encontrar o cara que vai me “completar” mas não vai me atazanar - porque eu sou brasileira e não desisto nunca... rsss – eu olho em volta procurando provas, ou no mínimo indícios, de que esse cara existe, sabe quem é a Camille Paglia, e não é gay. Vejamos.

No final de semana encontrei com um casal de amigos que têm mais ou menos a minha idade e que estão casados há alguns poucos anos. Ela estava comentando como, ao tentar operacionalizar o casamento, eles acharam mais fácil tratar tudo como se fosse uma empresa, e neste processo decidiram de comum acordo que seria mais lucrativo investir na profissão dele do que na dela. E eu respondi que é um pouco surpreendente como, depois de tantos anos de lutas feministas, de sutiãs queimados nas praças públicas, e de mulheres nas universidades, no âmbito do casamento, o que a gente conseguiu efetivamente foi tomar – agora de comum acordo – as mesmas decisões que eram impostas às nossas mães.

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Não sabe quem é a Camille Paglia? Pode começar por aqui:

http://en.wikipedia.org/wiki/Camille_Paglia

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Sei que hoje, neste contexto, eu me peguei ouvindo novamente um CD que eu rachei de ouvir no final da adolescência. O CD se chama “Tragic Kingdom” de uma banda chamada “No Doubt”. A vocalista, Gwen Stefani, tem o visual mais “mulher objeto” que se possa imaginar. Uma pin-up moderna, mistura de cheer-leader com Marlin Monroe, com os cabelos platinados e a boca vermelha, ela canta músicas altamente feministas, cheias de sarcasmo e ironia, num tom de voz irado, raivoso, muito agressivo. Me faz pensar em contradição, paradoxo, oxímoro. O que poderia ser mais adequado?

Aqui vai uma das músicas dela que eu mais gosto. Mando junto a tradução, que é pra facilitar. Adoro a frase em que ela canta, gritando raivosamente “Am I making myself...” e então num tom muito doce, “...clear?”:)

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Just A Girl

Take this pink ribbon off my eyes
I'm exposed
And it's no big surprise
Don't you think I know
Exactly where I stand ?
This world is forcing me
To hold your hand


'Cause I'm just a girl, little 'ol me
Don't let me out of your sight
I'm just a girl, all pretty and petite
So don't let me have any rights
Oh...I've had it up to here!

The moment that I step outside
So many reasons
For me to run and hide
I can't do the little things I hold so dear
'Cause it's all those little things
That I fear

'Cause I'm just a girl I'd rather not be
'Cause they won't let me drive
Late at night

I'm just a girl,
Guess I'm some kind of freak
'Cause they all sit and stare
With their eyes
I'm just a girl,
Take a good look at me
Just your typical prototype
Oh...I've had it up to here!
Oh...am I making myself clear?

I'm just a girl
I'm just a girl in the world...
That's all that you'll let me be!


I'm just a girl, living in captivity
Your rule of thumb
Makes me worry some
I'm just a girl, what's my destiny?
What I've succumbed to Is making me numb
I'm just a girl, my apologies
What I've become is so burdensome
I'm just a girl, lucky me
Twiddle-dum there's no comparison

Oh...I've had it up to!
Oh...I've had it up to!!
Oh...I've had it up to here!

Só uma garota

Tire esta fita rosa dos meus olhos
Estou exposta,
E isto não é novidade
Você não acha que eu sei
Exatamente onde estou
?
Este mundo está me forçando
A segurar a sua mão


Porque eu sou só uma garota, coitadinha de mim
Não me perca de vista
Eu sou só uma garota, toda pequenininha e bonitinha
Então não me deixe ter direitos
Ah, eu estou por aqui com isso!

No momento em que eu saio
Tantas razões
Para eu correr e me esconder
Não posso fazer essas coisinhas das quais gosto tanto
Pois são estas as coisinhas das quais tenho medo

Porque eu sou só uma garota, e eu preferia não ser
Porque eles não vão me deixar dirigir
à noite

Sou só uma garota
Acho que sou algum tipo de anormal
Pois eles todos sentam e me olham
Com seus olhos
Sou só uma garota
Olhe bem pra mim
Seu protótipo típico
Ah, estou por aqui com isso!
Ah, estou sendo clara
?


Sou só uma garota
Só uma garota no mundo...
É só o que vc me permite ser!


Só uma garota, vivendo numa prisão
Suas regras
Me deixam preocupada
Sou só uma garota, qual meu destino
?
Aquilo a que sucumbi está me deixando
Anestesiada
Só uma garota, me desculpe
O que me tornei é tão pesaroso
Só uma garota, sorte a minha
Não tem comparação

Ah, estou por aqui!
Ah, estou por aqui!
Ah, estou por aqui com isso!







2 comments:

*QUEL* said...

Olha Tati, eu te entendo...
Sou de uma familia na qual os homens ficaram com o intelecto e as mulheres com vida. E cá estou eu, juntando as duas coisas. Normal? Pra mim é. Pra eles é pavoroso.
Todo dia eu penso...coitado do meu pai..rs

Beijokas

Anonymous said...

Eu não posso te dizer que sei exatamente o que é isso... Conheço um pouco dessa história do Jung... Senti um pouco isso na pele qdo fazia terapia em Jaú... Faz sentido... Mas é meio esquisito... Essa história toda de equilíbrio é bem complicada... Já percebeu q qto mais simples, mais complexo? rssss....
Tá, fugi do assunto... Mas de fato eu acho que temos sorte de ter nascido nessa era. De estar vivendo alguns avanços. Algumas aspirações à igualdade... Ao menos podemos ter nossos empregos! =P Qto a esse negócio de escolhermos o mesmo que foi imposto ás nossas mães... Pior que é. =P
Beijão menina... Desculpa não ter te ligado. Chegeui tarde, e hj o dia foi esquisito (num bom sentido). Mas te vejo amanhã!
Beijão!